Nas últimas
semanas debates sobre racismo foram destaques mais uma vez nas redes sociais,
tendo em vista que estamos em um período eleitoral atípico, isso me deixa muito
esperançosa de que as pessoas estão acordando para o debate, para a construção
de um novo modelo de sociedade, uma sociedade mais justa e igualitária.
Aos meus 29
anos eu nunca presenciei tantas manifestações racistas, como nesses últimos
anos e gostaria de destacar que levando em consideração a minha idade muitas
coisas evoluíram de lá para cá, como, por exemplo, a criação de órgãos que
trabalhem os Direitos Humanos, garantindo de fato os direitos de classes menos
favorecidas, além de várias entidades Governamentais e não governamentais que visam combater
práticas racistas. A internet, herança da minha geração (que pode ser mocinha
ou vilã) em determinados casos também serve de força motriz para o avanço das
denuncias, ou até mesmo do conhecimento sobre práticas preconceituosas, não só
étnica.
Mas o que
chamou a minha atenção e é sobre isso que quero falar aqui, foi a quantidade de
pessoas, que dizem estarmos “ exagerando”, ou até que estamos generalizando
dizendo que “tudo agora é racismo”, tais declarações me assustou. Ai eu pensei,
será que as pessoas não estão tendo a noção do que é que está acontecendo?
Pessoas sinto lhes decepcionar mas tudo isso É RACISMO SIM, e acreditem não
estamos exagerando, estamos apenas lutando pelos nossos direitos. Se esse “barulho”
todo incomodar vocês, nos desculpem, é que não se muda uma sociedade em silêncio.
Precisamos abrir a boca mesmo, gritar, publicar, denunciar, compartilhar, até
que tais práticas sejam de uma vez por todas extintas, ou vocês acham que
devemos ficar em silêncio diante das atrocidades que vemos por ai?
Quando somos xingados de macacos estamos
sofrendo racismo sim, quando somos expostas situações constrangedoras por conta
da cor da nossa pele, isso também é racismo, e mesmo quando temos capacidade de
exercer uma função superior e somos obrigadas a exercer funções que são “pertinentes”
a pessoas da nossa cor, isso é racismo sim! Dizer que
o racismo não existe é tapar o sol com a peneira, quem é negro sofre
preconceito quase que diariamente.
E ai eu quero abrir uma aspas para me
posicionar sobre a minissérie do meu amigo Miguel Falabela ( amigos sim, afinal
ele fala de nós mulheres negras com tanta propriedade e intimidade que me sinto
intima) Essa semana ele estreará a minissérie intitulada, “ SEXO E AS NEGAS “ que
irá ao ar pela Rede Globo de televisão. Nesta
minissérie onde as “ protagonistas “ são mulheres e negras, será retratada o
cotidiano delas nas favelas do Rio de Janeiro. Gostaria de ressaltar que eu sei
de todas as mazelas e dificuldades que as mulheres negras, sobretudo as
periféricas ainda sofrem, e sei da herança histórica que as colocam nessa
situação vulnerável, o que não vem ao caso discutirmos agora e não quero também
de jeito algum esconder essa realidade. O que eu gostaria de me fazer entender
é que precisamos mudar o disco, mudar a forma de enxergar a mulher negra, viu
Falabela? Por mais que sua intenção seja de retratar a realidade da mulher
negra brasileira, como você mesmo declarou, está na hora de mostrar o outro
lado da moeda.
Estamos
cansadas de sermos as diaristas das novelas, as donas de bares, as dançarinas
de funk ( sem desmerecer as profissões, é claro ), afinal aqui fora das
telinhas existem negras juízas, empresárias, ministras, prefeitas, professoras,
nos conseguimos ocupar outros setores da sociedade, sabia? E a nossa sociedade precisa saber que essas
mulheres existem, principalmente as meninas adolescentes que assistem essas
novelas e minisséries e se vêem ali, elas precisam saber que elas podem ser
outras personagens também, inclusive na vida.
Ai eu te
pergunto uma minissérie intitulada “ o Sexo e as negas “ te remete ao que?
Pense rápido! Ahhh mas é só um título !! Não, isso não é só um título, isso é a
desconstrução de todo um trabalho feito para combater o racismo, o preconceito
com relação a gênero, Intrínseco nesse título tem muitas outras questões que
geraria assunto para outra minissérie.
Então caro
amigo Falabela, existe outra realidade que precisa ser contada, a realidade de
mulheres bem sucedidas que vivem ou viveram em favelas e que não precisaram ser
expostas à sexualidade ou que não foram mães precoces, ou que não precisaram
ser empregadas domésticas para chegar onde chegaram, mulheres que galgaram a
sua vida profissional através dos estudos, de uma base familiar sólida e que
não são mães solteiras.
Falabela se
me permite gostaria de lhe dizer que mesmo que você não tenha tido a “intenção“
de ser racista, você foi. Creio que um negro consciente dos malefícios e do
retrocesso que essa minissérie retrata a nossa luta diária, jamais escreveria
uma minissérie com esse título, isso por mais “engraçado“ que seja. Nós não
perdemos o humor, é que o HUMOR NEGRO, não tem graça nenhuma, mesmo que o
título tivesse sido “O sexo e as brancas “, estaria aqui lhe escrevendo em
defesa da mulher, que deve ser respeitada e que não deve ser colocada exposta a
preconceitos oriundos de uma minissérie repleta de preconceito e desvalorização
à mulher brasileira. O que queremos caro autor, ator, produtor, diretor, é
sermos tratados com respeito, e sem gracinhas, porque é por causa de gracinhas
como essas que somos diariamente submetidos a atitudes racistas. E Não, #OSexoEasNegasNãoMeRepresenta e você também
está longe de me representar.
Por Íris Fabianna